sexta-feira, 18 de maio de 2012

Selva de pedras X Mente .




No meio da selva de pedras e do céu cinzento desse dia de outono, caminho. No meio do caminho que me leva à algum lugar que eu ainda não sei qual é, ando. Ando cabisbaixa. Ao redor, carros e mais carros indo e vindo, surgem de todas as direções. A multidão de pessoas caminhando apressada e inexpressivamente pelas calçadas. Eu, perdida.
Crianças descalças e maltrapilhas esperando que os sinais de trânsito fechem pra que possam correr para o meio da faixa de pedestres e improvisar algum número qualquer de arte. Mas de arte não conhecem muita coisa além da arte de sobreviver pelas ruas. Charlatões nos carros com os vidros fechados. Mas, principalmente, com olhos fechados. Bem fechados, de modo a não enxergar nada disso. Não conhecem nada além do próprio umbigo. E eu, mais uma vez, perdida.
Pessoas completamente animalescas, vivendo abaixo da miséria, caçando restos de comida pelos lixos afora. Comida essa desperdiçada banalmente por jovens de classe média e, certamente, média ou baixa inteligência. Sabem tudo sobre a balada do ano e sobre a festa do momento. Mas desconhecem qualquer problema social. Eu, perdida, novamente.
Trabalhadores honestos vivendo em condições precárias, cercados por medo e horror nas favelas. Enquanto filhinhos de papai sobem o morro pra comprar mais algumas gramas daquele pó incrível que os faz viajar e esquecer pelo menos um pouco toda essa loucura que é viver. Tatiana, perdida.
Mazelas, crises, desgraças. A selva de pedras é fria de mais. Mesmo que o dia seja de extremo verão e calor. Ninguém vê nada além de si, de seus problemas, seu umbigo, sua festa, sua alegria sintética. Mas eu, eu vejo. Vejo tudo, todos, a todo momento. Vejo o senhor que mal consegue andar e não tem um familiar por perto pra auxiliá-lo na árdua tarefa de atravessar a rua. Vejo o bebê chorando de fome, chorando de frio, chorando porque é o que lhe resta fazer. Vejo o cachorro mal cuidado, mais ou menos como eu: perdido também. Vejo o casal que briga por mais uma besteira qualquer, enquanto os filhos quase se matam por coisa alguma. E por ver tanto, tanta coisa que me entorpeço.
Imersa em meus pensamentos estou à salvo. No mundo da minha imaginação, não existe nada disso. Eu sei que não adianta maquiar a realidade porque depois ela vem ainda pior. Mas viver tudo isso o tempo inteiro é impossível.
Ainda bem que nasci com esse troço, essa mania de divagar, devagar e calmamente. Crio o mundo de sonhos, de fantasias e utopias. Enlouqueço-me e embriago-me de boas intenções e histórias. A mente é uma imensidão, é muito maior que qualquer arranha-céu.
Se o mundo te fere com mazelas, fuja. Fuja pro lugar mais seguro e bonito que pode existir: a sua própria mente.



" Se a realidade te alimenta com merda, meu irmão, a mente pode te alimentar com flores." Caio Fernando de Abreu.

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